sexta-feira, 11 de novembro de 2011

E agora, algo mais moderno que a modernidade

Na edição de hoje do jornal O Público, são publicados alguns excertos do discurso circular que tem sido profusamente utilizado pelo ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira:

 “Precisamos de uma legislação laboral mais moderna e mais flexível que promova a contratação, que facilite o emprego e contrarie a precariedade laboral. Para crescer temos de trabalhar mais e melhor, temos de ser melhores. Estamos também a debater em sede de concertação social a introdução de meia hora laboral por cada dia de trabalho. É uma medida de carácter excepcional que visa aumentar a competitividade das nossas empresas”, disse o governante.”


Perguntar-se-á:
1.º Como se pode saber qual o grau de modernidade de uma legislação laboral e qual a referência utilizada nessa avaliação?
2.º Desde quando é que a flexibilização da legislação laboral facilita o emprego e contraria a precariedade?



Relativamente ao moderno - mais na acepção de novidade do que no sentido de evolução - importa tecer desde logo dois reparos: Em primeiro lugar, a flexibilização dos direitos dos trabalhadores nada tem de novidade, até porque corresponde ao estado em que as relações laborais  se encontravam antes da intervenção do direito do trabalho. Em segundo lugar e, face ao que se disse antes, o regresso ao passado não é uma evolução mas sim uma regressão. Em suma, esta apregoada modernidade não tem nada de novo nem tem sentido qualitativamente evolutivo.
Há (Hall, 2000) quem lhe chame pós-modernidade (movimento sócio-cultural presente no capitalismo moderno) e que conduz à desumanização, fruto de uma nova realidade marcada por um ambiente económico global caótico, desregulado, ultracompetitivo, com escalas espácio-temporais aceleradas (SANTOS), subordinadas a um ritmo turbulento e, porventura, económica e socialmente insustentável[1].
Todas a informação que é veiculada às pessoas parte do pressuposto (errado) de que não existe qualquer outra alternativa a esta fórmula de modernidade; que o Estado social é um cadáver exótico que vai cambaleando por aí ao melhor estilo zombie; que para sobrevivermos enquanto civilização temos de abdicar de uma série de direitos (mormente os laborais) que se tornaram incómodos neste contexto de empobrecimento deliberado do povo português.

Sempre houve quem defendesse que a precariedade de alguns trabalhadores era causada pelo excessivo rigor do vínculo jus-laboral. Alegavam que este contrariava o pragmatismo dos gestores das empresas que, como instrumento de gestão, queriam ter a liberdade de despedir sem as habituais resistências legais - a começar, as causadas pelo princípio da segurança no emprego com assento constitucional (art.º 53.º, da CRP). Tradicionalmente reclamavam a atenuação da severidade da justa causa nos despedimentos disciplinares; a diminuição ou até a total exclusão das indemnizações por despedimento ilícito ou por despedimento por justa causa objectiva (e.g. despedimento colectivo, extinção do posto de trabalho); em suma, reclamavam o fim da protecção da segurança no emprego. Assim, segundo o referido entendimento, a utilização pelas empresas de trabalhadores em situações precárias, com os clandestinos recibos verdes, nada mais era senão uma consequência da obstinação cega do Estado Português em manter esta legislação laboral. 
É verdadeiramente incrível constatar  a irresponsabilidade com que estes políticos ultraliberais caluniam os direitos laborais estruturantes; que têm servido guardiões da paz social e de garantes da sustentabilidade do próprio modelo económico que os rejeita.




[1] Esteves da Mota, O Assédio Moral ou assédio não discriminatório, (Trabalho Final relativo ao XII Curso pós graduadode especialização em Direito do Trabalho), 2011, UL, FDL, IDT

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